Existem pessoas que caracterizam a água como um elemento de leveza, de tranquilidade; um elemento com conotação pueril. De tão pura, se tornou símbolo religioso de nova vida no cristianismo. Enfim; as águas renovam.
Me soa conveniente refletir sobre a água (elemento muito propício à reflexão, tanto fisicamente como internamente, isto é, uma reflexão do fundo de nossa consciência).
Desde criança a água se apresenta com frequência em minhas memórias; das mais banais às mais doces, das mais importantes às mais amargas, e o resultado, é claro, é a pura nostalgia. Nostalgia... Tão constante em minhas lembranças como a água. Hoje, como de praxe, estive um tanto nostálgico. Pensei nas relação quase que simbólica das últimas semanas com os últimos anos; uma relação instríseca, uma relação húmida.
À tarde, estava eu a ler não muito enfadonhamente Memórias Póstumas de Brás Cubas, na varanda ao som da chuva e ao soprar da brisa. Enquanto lia, me sentia tão inerte, passivo, sereno. Lembrei-me de coisas como o parque Barigüi (que aliás está sendo castigado pelas próprias águas somadas às da chuva quase incessante) e outras coisas diversas que dizem respeito ao meu passado.
Por falar nesta chuva incessante que vem castigando Curitiba, arrisco dizer que o parque Barigüi e eu estamos passando pela mesma situação: as águas dos últimos dias estão a nos lavar em seu frescor aterrorizante e hipnotizante, elas predizem a mudança em cada gota, e, embora não seja aparente, estão nos limpando e nos livrando das roupagens antigas. Além de destruir, a água refresca, mas muitos não se contentam com o gosto simples da água; acrescentam sabores tais como os dos chás. Chás que deixam suas excências sangrarem para serem dissolvidas e acalmadas pelas águas para que se obtenha um paladar agradável, semelhantes às memórias que se deixam dissolver para que se obtenha um espírito mais puro e mais agradável. Ah, nada como boas memórias dissolvidas!
Memórias dissolvidas lembram, para mim, águas turvas de rios pacatos, porém quando os adentramos, cortamos os pés nas pedras do fundo. Às vezes o que recordamos como algo bom, torna-se terrível quando olhamos mais profundamente... Alguém que se foi, uma palavra dita na hora errada.
ResponderExcluirMemórias como águas, a vida como o mar, onde os rios encontram seu fim.